Noite fria e chuva fina. Tarde demais para uns, cedo o bastante para outros e para quem vive a espera do momento de ser feliz não existe a hora certa. O oceano vira uma poça d'água na frente de casa.
Tudo fechado. Parecia que a cidade tinha sido inabitada de propósito para que pudéssemos andar tranquilamente. O destino éramos nós dois em qualquer lugar e o ambiente parecia estar à espera de um espetáculo, um momento único que não poderia ser interrompido pelo caos cosmopolita.
Notei sua maquiagem, seu cabelo, o sorriso se abria e os olhos se fechavam. O perfume já não é o mesmo; Deus teve piedade, talvez não me segurasse. Muita coisa mudou.
Risadas foram conquistadas, um pouco de saudosismo e lembranças de um tempo que passou. O tempo não passou para ela. Mas o tempo foi injusto, que ao seu lado o relógio não teve pena e correu o quanto pode. O já vou indo foi interrompido pelo fica mais um pouco.
Como um adolescente que não encontra palavras certas, como uma criança que não conhece tantas palavras, como um adulto que escolhe demais o que falar, como um idoso que já ouviu de tudo e lamenta por quase tudo. Apequenei-me com tua presença, com tua voz e o seu novo perfume. Um refém.
Um súdito que ouviu calado a sua rainha, um paciente quando ouve atentamente sua analista, um filho obediente que ouve sua mãe, o aluno dedicado ao ouvir a sua professora. Observei, gravei cada palavra, sendo que nenhuma com embargo na garganta. Fluiu naturalmente.
Mas os olhos também dizem, às vezes mais que a boca. Ainda tinha brilho lá dentro, pensei que fossem lágrimas, então esperei elas caírem. Nenhuma gota. Mas eu percebi, diziam algo diferente do que eu ouvia. Ficará bem guardado.
Fiquei a espera do abraço que timidamente foi negado, mas o brilho nos olhos ainda era possível ver. Estavam lá. Angústia, tristeza, raiva, ressentimento ou qualquer outra inquietação. Contei os passos até o portão. Foram quatorze. Daí para dentro eu já não sei mais nada.
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